08 outubro 2015

José de Oliveira Correia



JOSÉ DE OLIVEIRA CORREIA
24 de Junho de 1900 – 8 de Outubro de 1974


Querido Padrinho,

Sabes, tu deixaste a tua terra para ir viver na minha e eu deixei a minha e vim viver para o teu Porto.
E gosto tanto da tua terra.

Nada já é como há quarenta e um anos quando te foste embora.
Agora, quando as pessoas querem falar umas com as outras, já raramente marcam encontros pelo telefone fixo, já não se enviam cartas de amor ou postais de Natal, já não se marcam encontros no café para passar uma tarde a por a conversa em dia. 
Já quase não há eléctricos e os poucos que há são para passeios dos turistas. Os trolley-bus desapareceram. Mas há o Metro que só existia em Lisboa.

Sabes, agora as pessoas encontram-se em lugares virtuais, tem amizades virtuais, dão abraços virtuais, passam o tempo à frente de um ecrã, seja ele de computador, tablet, telemóvel ou televisão. Já se lêem poucos livros, jornais e revistas em papel. As longas e belas cartas de amor foram substituídas por mensagens codificadas de meia dúzia de palavras ocas e, tantas vezes, sem sentido, enviadas por um aparelho esperto em que todos estamos viciados e a que chamamos telemóvel.
O cinema evoluiu tecnicamente mas continua a ser o ecrã mágico.

Já não ias conhecer estes pais, Padrinho! Aquele dia de Liberdade que aconteceu no ano em que partiste, transformou-se num país estranho onde os amigos daqueles que foram depostos nessa madrugada de libertação, ocupam ainda os lugares de destaque e de decisão. Falaste-me tantas vezes do “cabeça de abóbora”. Hoje o que está lá, é uma figura equivalente sem essa protuberância mas com um papel semelhante de corta-fitas. E que até teve a distinta lata de não aparecer na comemoração da "patroa", a implantação da República que tanto te orgulhava sendo dela contemporâneo. Ah. é verdade, e o cinco de Outubro deixou até de ser feriado, Padrinho. Acreditas?

As pessoas já não escolhem a sua profissão para a vida. Os jovens quando acabam os seus estudos universitários são forçados a emigrar.

Padrinho, já é tudo tão diferente. Nem tudo estará pior. Fizeram-se progressos na medicina, democratizaram-se algumas áreas. Mas, lembras-te quando nos passeios contigo eu encontrava o Professor Ventura? O respeito que eu tinha por ele? E ainda tenho, Padrinho. Muito do que sei hoje e do homem eu me tornei também lhe devo a ele. Mas está tudo tão diferente, Padrinho. Hoje, os professores muitas vezes tem que se esconder ou fugir dos pais e dos alunos para não serem agredidos verbal e fisicamente. Muitos deles não encontram colocação. A maioria dos artistas continuam a sobreviver, muitas vezes, apenas porque têm outra profissão. Aí nada mudou, Padrinho. A liberdade trouxe coisas tão lindas naquela manhã de Abril que tu festejaste com tanta alegria e cuja data eu me habituei a celebrar. Mas muitas delas, Padrinho, já lá vão.

Hoje, dificilmente sobreviverias com a tua profissão artesanal. Já quase não há profissões artesanais. Eu já não teria fatos para levar ao Sr. Vieira e receber aquela notita de vinte escudos tão apetecida. Já não há clientes como ele. Toda a gente compra a roupa nos hipermercados ou centros comerciais. O que é isso? São mercados, Padrinho, onde há de tudo e as pessoas passam lá os dias metidos a prestar culto ao seu deus. Consumismo é o seu nome.

E os passeios que dávamos. Aquele que tu chamavas “a volta dos tristes”. As tardes lindas que passei na tua companhia. Ou quando eu ia à pesca e tu ficavas ali embevecido a ver-me todo entusiasmado à espera que o peixe picasse. Sabes, Padrinho, voltei a pescar e com a mesma cana. Ainda a tenho e quando olho para ela lembro-me de ti.
Mas , quanto a lembrar-me de ti, nem te digo…
Não há dia que passe sem que sinta, de uma forma tão dolorosa, a tua falta.
Talvez não a tua falta. Porque não me faltas nunca! A falta da tua presença física. Do teu aconchego, da tua protecção, do teu abraço apertado. Do teu colo. Do teu amor.

Já nada é como dantes. Padrinho. Desde que foste tudo mudou. Menos uma coisa.
Já poucos se lembram de ti. Mas esses poucos sentem saudades tuas. Não deixaste mágoas para trás nem ninguém satisfeito com a tua partida. Sempre foste de uma verticalidade ímpar.
Sabes o que não mudou? O teu lugar no meu coração.
E está cada vez mais cheio de ti, do teu nome, do teu exemplo, da grandeza do teu carácter.

Viverás para sempre porque os grandes nunca morrem.
Quem sabe serei o último a recordar-te aqui. Mas, que importa, vamos encontrar-nos aí.
E aí não vou mais largar-te!

Amo-te PADRINHO!

Maia, 8 de Outubro de 2015

Teu afilhado,
Zézé

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